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Entrevista com o Doutor (USP) e Juiz de Direito (TJESP) Walter Godoy

Entrevista conduzida por Pedro Marcos Nunes Barbosa.

ip-iurisdictio:  Como a orientação e o convívio com o Professor Newton Silveira influenciou a sua forma de escrever e de pensar?

Walter Godoy: A influência acadêmica do Professor Newton Silveira sobre mim foi absoluta. Desde a maneira concisa de escrever, até a forma de estruturação do raciocínio jurídico a partir do exame da natureza jurídica do instituto e do tratamento constitucional que recebe, passando pela legislação infraconstitucional e a a realização do juízo de subsunção dos fatos à norma. Posso dizer que ele é um homem extraordinário, não apenas por ser extremamente culto, mas também por sua erudição.

ip-iurisdictio: Como a experiência de Juiz de Direito lhe foi útil ao olhar crítico que tem para a interlocução entre o ensino jurídico e a prática jurídica?

Walter Godoy: No dia a dia forense, é possível constatar a falta que faz uma cadeira voltada para a composição de conflitos em contraposição ao preparo tradicional para o litígio. O exercício da jurisdição aponta, inequivocamente, para a necessidade de investimento substancial no consultivo, seja para a prevenção de conflitos, seja para a composição amigável da lide.

ip-iurisdictio: Qual sua ótica sobre as críticas realizadas por alguns autores com relação à necessidade de proteger as balizas clássicas da tutela do Direito de Autor contra a erosão dos filtros mínimos da originalidade (haveria uma crise de originalidade?), e sobre a ótica do Prof. Dr. Denis Barbosa quanto a exigência de um contributo mínimo para a tutela da criação estética?

Walter Godoy: Essas são questões de alta indagação, que garantem a sobrevivência dos advogados da área. A indeterminação de conceitos parece ser proposital para que seja possível avaliar, como em um sistema de cláusulas abertas, a melhor solução para o caso concreto. Novamente, a precaução recomenda que sejam consultados os especialistas da área diante do caso concreto. De todo modo, também parece impossível o desenvolvimento de atividades intelectuais sem um rico repertório de domínio público.

ip-iurisdictio: O que poderia ser melhorado, na hipótese de uma edição legislativa para modificação da LDA (Lei 9.610/98), com relação ao rol de limitações aos Direitos de Autor no tocante às bibliotecas, museus e outros locus culturais/educacionais?

Walter Godoy: A regra contida na LDA indica que tudo o que não estiver expressamente autorizado – em termos de utilização de direitos autorais – estará automaticamente proibido. Nesse sentido, quanto mais claras as hipóteses de exclusão da esfera de proteção dos direitos autorais, maior segurança haverá para ambos lados.

ip-iurisdictio: Em sua opinião: quais os três julgados mais importantes realizados pelo STJ nas últimas duas décadas, com relação aos Direitos de Autor e a Propriedade Industrial, e entre os temas abordados por tais julgados qual merece maior reflexão da comunidade jurídica?

Walter Godoy: Como é de conhecimento geral, os Tribunais Superiores não têm dedicado a devida atenção à Propriedade Intelectual, ao contrário do que ocorre, por exemplo, na Suprema Corte americana, que frequentemente decide questões importantíssimas e de grande repercussão econômica nesta área do conhecimento. Assim, prefiro voltar meu olhar para os casos que ainda serão objeto de análise pelos tribunais de cúpula, sobretudo pelo STF. Dentre os caso sub judice, seguramente, o mais importante é o que trata da prorrogação do prazo de proteção de patentes (artigo 40, parágrafo único da LPI). A meu sentir, este caso será um verdadeiro divisor de águas para o futuro da política industrial brasileira.

ip-iurisdictio: Quais foram seus quatro interlocutores acadêmicos sêniores (e que não foram seus orientadores) que mais influenciaram suas obras?

Walter Godoy: Karin Grau-Kuntz, Ricardo Lewandowski, Paula Forgioni e Cláudio Roberto Barbosa.

ip-iurisdictio: Se fosse possível alterar a Convenção de Berna e o Acordo TRIP’s no tocante aos Direitos de Autor e a Propriedade Industrial quais modificações seriam mais benéficas à comunidade nacional?

Walter Godoy: Os tratados internacionais devem ser redigidos de maneira suficientemente elástica para congregar os interesses de todos os países signatários, conferindo a cada um a autonomia necessária para o seu pleno desenvolvimento. No entanto, como ressaltado pela Professora Ruth Okediji, os tratados internacionais em matéria de Propriedade Intelectual estão inseridos em um contexto de uma nova colonização dos países em desenvolvimento. O desafio na área dos chamados “direitos da mente” é equilibrar a balança entre inovação e acesso, residindo nesta aparente dicotomia a harmonia de todo sistema de Propriedade Intelectual, atualmente administrado pela OMPI.

ip-iurisdictio: Com relação aos conflitos – cada vez mais comuns entre autores e titulares (cessionários) dos direitos econômicos sobre obras, há alguma modificação que seria bem-vinda à LDA (Lei 9.610/98) ou à LPI (Lei 9.279/96)?

Walter Godoy: Como ferramenta de desenvolvimento econômico, tecnológico e cultural – levandio-se sempre em consideração o interesse social – penso que as recompensas criadas artificialmente pelo sistema de Propriedade Intelectual já não se justificam em algumas áreas, em que os agentes de mercado já são devidamente remunerados pela inovação, ao passo que, outros ramos, como o de biotecnologia, o incentivo legal mostra-se fundamental.

ip-iurisdictio: Quais as duas melhores Teses de Doutorados e as duas melhores Dissertações de Mestrado que você teve oportunidade de arguir ou de ler?

Walter Godoy: De Doutorado: O Estabelecimento Comercial Virtual, Universalidade, Direito à Identidade e Tutela através de Direito Real de Pedro Marcos Nunes Barbosa e O Regime Jurídico do Segredo de Comércio no Direito Brasileiro de Elisabeth Kasznar Fekete.

De Mestrado: A Relação entre Informação, Propriedade Intelectual, Jurisdição e Direito Internacional de Cláudio Roberto Barbosa e Direito de Autor no Desenho Industrial de Newton Silveira.

ip-iurisdictio:Na sua opinião o Conselho Nacional de Direito Autoral deveria ser recriado?

Walter Godoy: Sim. Trata-se de órgão estratégico para o desenvolvimento de uma política de direitos autorais, com fundamento no que estabelece o artigo 5º, combinado com o que dispõem os artigos 215 e seguintes da Constituição Federal.

ip-iurisdictio: O que pensa a respeito das políticas públicas do CNPq a respeito da exigência do quantitativo de publicações e se tal demanda impacta na qualidade do que vem sendo produzido no contexto acadêmico?

Walter Godoy: Pessoalmente, não acredito na ditadura estatística imposta aos pesquisadores em detrimento da qualidade que se espera na pesquisa científica, uma vez que o seu resultado desta política leva ao indesejável fracionamento de passos evolutivos substanciais, com a inevitável redução da originalidade científica.

ip-iurisdictio: Qual sua opinião sobre a especialização de Juízos Federais (JFRJ/TRF-2) e Estaduais (TJSP, TJRJ e TJRS) em Propriedade Intelectual?

R: A especialização deve ser vista com cautela para que não se formem feudos e se cristalize o entendimento jurídico sobre determinada matéria por um número reduzido de magistrados. A pirâmide recursal já é um bom filtro para a uniformização de entendimento, tudo a partir de uma vasta gama de julgados. Talvez o mais importante seja incluir a Propriedade Intelectual nos editais dos concursos para as carreiras jurídicas.

ip-iurisdictio: um momento de desprestígio (econômico) à vida acadêmica, que conselho daria a um jovem que deseja cursar mestrado e doutorado em Direito?

R: Inicialmente sugeriria que se esforçasse para ingressar em uma instituição de renome, e, no desenvolvimento da sua pesquisa, que preservasse o senso crítico, a fim de que possa produzir um trabalho inovador.

ip-iurisdictio:Quais os dez (ou mais) autores de Propriedade Intelectual recomendarias a leitura para um jovem acadêmico?

R: Tullio Ascarelli, João da Gama Cerqueira, Newton Silveira, Denis Borges Barbosa, Pedro Marcos Nunes Barbosa, Elisabeth Kasznar Fekete, Cláudio Roberto Barbosa, Karin Grau-Kuntz, Paula Forgioni, Calixto Salomão Filho, Manoel Joaquim Pereira dos Santos, Carlos Alberto Bittar e Antônio Chaves.

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